Os Evangelhos e Jesus Cristo
Praticamente tudo que sabemos sobre a vida terrena de Jesus é encontrado nos quatro Evangelhos contidos no NT.
Fontes externas
A vida de um pregador itinerante que atuava numa remota província do Império Romano provavelmente não seria incluída nas obras de historiadores romanos, que tinham (na opinião deles) coisas mais importantes com que se ocupar.Tácito faz uma rápida referência a Jesus, e mesmo assim só para explicar o nome dos "cristãos" que estavam sendo mortos pelo imperador Nero.
Nem mesmo os historiadores judeus têm muito a dizer sobre ele. A mais famosa história dos judeus foi escrita por Josefo, no final do primeiro século. Nesta obra, em uma passagem ele faz referência a Jesus como um operador de milagres que era o Messias e que ele foi morto por Pilatos e mais tarde reapareceu aos seus discípulos. É possível que a passagem tenha sofrido alguma interpolação posterior ao ser transmitida e copiada por escribas cristãos (por que Josefo chamaria Jesus de Messias?), mas provavelmente os elementos básicos são genuínos.
Outras tradições judaicas sobre Jesus foram preservadas nas obras dos rabinos. Eles dizem que ele praticava magia, iludia o povo, e disse que não veio para destruir a lei nem acrescentar nada a ela. Ele foi enforcado na véspera da Páscoa por heresia e por enganar o povo, e teve cinco discípulos que curavam os enfermos. Isto dá uma idéia de como Jesus era visto pelo povo que tinha a mesma opinião dos membros do Sinédrio, o conselho superior dos judeus que o condenou à morte.
Uma fonte mais promissora de informação são os vários "evangelhos" que não foram incluídos no NT. Tais obras são conhecidas há muito tempo, mas a recente descoberta do Evangelho de Tomé em Nag-Hammadi, no Egito, trouxe um renovado interesse por obras desse gênero. O Evangelho de Tomé contém uma série de afirmações atribuídas a Jesus. Obviamente elas foram reformuladas ou editadas por cristãos radicais, mas é possível que aqui e ali, neste e em outros documentos semelhantes, tenham sido preservados fragmentos de tradições genuínas sobre Jesus. No entanto, o fato de a igreja primitiva ter excluído todos eles da lista aprovada das Escrituras indica que a nossa busca provavelmente não será bem-sucedida.
Os Rolos do Mar Morto, a biblioteca de uma seita judaica que existia pouco antes e durante a época de Jesus, descobertos nestas cavernas (FOTO) em 1947, ajudaram a esclarecer o pensamento corrente na Palestina daquela época. Embora alguns autores tenham tentado encontrar referências a Jesus nesses documentos e tenham usado os mesmos para criar retratos bizarros a respeito dele, o fato é que os Rolos nunca falam sobre Jesus ou qualquer um dos seus seguidores. O que é registrado sobre os membros da seita e seus inimigos não tem ligação com a história de Jesus, embora nos ajude a entender melhor o mundo em que Jesus viveu e as idéias religiosas comuns naquela época.
Isto significa que na prática nosso conhecimento sobre Jesus se limita ao que nos é dito no NT. E mesmo aqui o campo vai aos poucos se reduzindo. As cartas de Paulo e os outros autores apostólicos fazem poucas referências a acontecimentos da vida de Jesus, embora eles tenham dado grande importância a seu ministério como fato histórico e tenham sido fortemente influenciados pelo que ele ensinou.
Uma história lembrada e recontada
Logo, para obter o registro escrito da vida e do ensinamento de Jesus temos que recorrer aos Evangelhos. Estes só foram escritos uns 30 anos após a morte de Jesus. Durante este período de três décadas o material que acabaria entrando nos Evangelhos foi preservado e transmitido de forma oral e em registro escritos que se perderam.
Essa tradição foi transmitida com todo o cuidado. Nas escolas judaicas, as crianças aprendiam a memorizar informações e tradições orais de forma bem precisa, e os rabinos judeus que viveram um pouco de pois dessa época tinham o mesmo cuidado ao transmitirem ensinamentos que não haviam sido colocados por escrito. Seria natural esperar que os cristãos de origem judaica lembrassem e preservassem de forma bem acurada o que Jesus ensinou. O material que aparece nos Evangelhos foi ensinado originalmente em aramaico, a língua falada por Jesus, e numa forma poética que era fácil de memorizar.
As pessoas lembram aquilo que querem lembrar. Isto não significa que os ouvintes de Jesus fizeram questão de esquecer aquilo que os perturbava ou que consideravam difícil de aceitar. Pelo contrário, há muito material nos Evangelhos que deve ter sido difícil e desafiador para os primeiros cristãos, e mesmo assim foi fielmente preservado.
A história de Jesus foi lembrada e recontada porque era relevante para a vida da igreja. Por exemplo, os primeiros cristãos não tinham outra opção que não fosse debater com os judeus que se opunham a eles; logo, era essencial para eles lembrar como Jesus havia discutido com os judeus alguns anos antes. Ao terem que tomar decisões de natureza ética em áreas como, por exemplo, casamento e divórcio, precisavam do ensinamento de Jesus como palavra de autoridade em tais assuntos. Assim sendo, ao lermos uma passagem dos Evangelhos, sempre é bom perguntar qual era a sua importância para a igreja primitiva. A história de Jesus não foi preservada por mero interesse acadêmico em história, mas por causa da sua relevância prática para os primeiros cristãos. Não era história "pura", mas história "aplicada".
As pessoas também tendem a lembrar e transmitir histórias e ensinamentos dentro de certo padrão formal. Histórias de milagres de cura, por exemplo, apresentam, pela ordem, a condição da pessoa sofredora, a maneira como se processou a cura, e os resultados que produziu. Muitas histórias sobre Jesus descrevem uma situação em que ele se encontrava, ou uma pergunta feita a ele, e culminam no ponto essencial: uma afirmação de Jesus feita com autoridade sobre o assunto em questão.
O propósito dos autores dos Evangelhos
O Evangelho de João levanta a questão de como os Evangelhos se relacionam com a história. Aquilo que é descrito nos Evangelhos realmente aconteceu? Já indicamos que os Evangelhos baseiam-se em tradição com cuidado na igreja. Ao mesmo tempo, devemos ter em mente que os Evangelhos procuram apresentar o significado cristão da pessoa de Jesus. Seu propósito básico é pregar o evangelho para converter os não-cristãos e fundamentar os cristãos na sua fé.
Isto significa que não são meros relatos históricos, como seria, por exemplo, a biografia de um soldado famoso. Os autores não estavam tentando fazer um relato histórico detalhado da vida de Jesus com tudo na sua devida ordem cronológica. Isto fica bem claro, por exemplo, quando se faz uma comparação entre a ordem dos acontecimentos em Mc 4--5 e a ordem que aparece em Mt 13, Mt 8 e Mt 9.
Além disso, os Evangelhos registram pouca coisa sobre alguns aspectos da vida de Jesus: quase nada é dito a respeito da vida dele antes da idade dos 30 anos , e mesmo o relato do seu ministério é incompleto. Certamente não há ocorrências ou fatos suficientes para preencher toda a sua vida pública ativa. Não devemos culpar os autores dos Evangelhos por deixarem de fazer algo que não era seu objetivo.
Mas isto não quer dizer que não se preocupavam com a história. Os Evangelhos não são invenção. No prefácio do seu Evangelho (Lc 1.1-4)), Lucas dá grande ênfase ao fato de estar usando depoimentos autênticos de testemunhas oculares. A história certamente era importante para ele e não há motivo para supor que os outros autores pensavam de forma diferente.
Qual era, pois, o objetivo deles? Eles estavam pregando o evangelho, as boas novas. Estavam apresentando Jesus como o Cristo, o Filho de Deus (Mc 1.1). Eles escreveram para que seus leitores cressem nele e, crendo, tivessem vida eterna (Jo 20.31). Portanto, retrataram Jesus como os seus seguidores o viam. Para eles, Jesus não era um homem comum, nem mesmo um profeta fora de série. Era o Senhor a quem Deus havia ressuscitado dos mortos e que agora estava vivo e ativo no céu. Eles não conheciam nenhum outro Jesus. É possível que tivessem uma opinião diferente a respeito dele antes da ressurreição (veja Lc 24.19-24), e até mesmo a ressurreição não obrigou à fé todos os que ouviram falar sobre ela. Mas eles creram em Jesus como resultado do impacto total que ele tivera sobre eles, e, diante disso, só podiam apresentá-lo da maneira que o fizeram.
"Seria impossível registrar a grandeza desta pessoa numa única descrição. Assim, foram feitos quatro retratos, cada qual destacando seus próprios aspectos peculiares do caráter de Jesus."
Assim sendo, a história que aparece nos Evangelhos é a história do ponto de vista dos cristãos. Um não cristão veria as coisas de forma diferente - alegando, por exemplo, que a ressurreição não podia ter acontecido. Seria interessante ter uma história de Jesus escrita deste ponto de vista, mas nenhuma chegou até nós. O que temos são Evangelhos, escritos por seguidores de Cristo com a finalidade de levar os outros à fé, mas nem por isso eles deixam de ser relatos históricos.
Quatro retratos de Jesus
Cada um dos autores evangélicos nos apresenta Jesus de uma forma bem peculiar. Seria impossível registrar a grandeza desta pessoa numa única descrição. Assim, foram feitos quatro retratos - quatro ângulos fotográficos da mesma cena, cada qual destacando seus próprios aspectos peculiares do caráter de Jesus.
Mateus se concentra no relacionamento de Jesus com a fé judaica. Ele mostra como Jesus veio para cumprir o AT, mas ao mesmo tempo para julgar os judeus por serem infiéis à sua religião. Nenhum outro Evangelho denuncia com tanto vigor a postura hipócrita dos fariseus. Os judeus são convidados a verem em Jesus o Messias prometido, o Filho de Davi; e o juízo é pronunciado sobre eles pelo fato de tantos se recusarem a crer. Mateus apresenta Jesus, em grande parte, como um mestre. Ele nos deu um relato sistematizado dos ensinamentos de Jesus para a instrução da própria igreja e seu trabalho de evangelização.
Marcos enfatiza a ação em vez do ensinamento. Ele ressalta a forma como Jesus ensinou a seus discípulos que o "Filho do Homem" devia sofrer e ser rejeitado, e que deviam estar preparados para trilhar o mesmo caminho. Quem procurasse entender Jesus como sendo alguém diferente do Salvador crucificado acabaria fazendo uma interpretação errônea. Os judeus esperavam um Messias que seria um líder político e um personagem glorioso. Para eles, era difícil reconhecer Jesus como o Messias, porque ele proferiu ser um servo humilde e sofredor. Somente na sua segunda vinda ele aparecerá como Rei em toda sua glória.
Lucas salienta as bênçãos da salvação que Jesus trouxe. Seu Evangelho enfatiza os sinais da vinda do Messias, profetizados no AT e cumpridos na cura dos doentes e na pregação do evangelho aos pobres e necessitados. Lucas ressalta especialmente a graça de Deus revelada em Jesus e concedida àqueles que pareciam menos dignos dela: mulheres pecadoras e gananciosos cobradores de impostos. Pois é exatamente isto que a graça significa, que homens e mulheres não podem fazer nada para merecê-la.
Finalmente, João revela Jesus como Aquele que foi enviado por Deus Pai para ser o Salvador do mundo. Como Filho, ele tem a autoridade de seu Pai, vivendo em comunhão íntima com ele. João é o que mais se aprofunda naquilo que Deus revelou e destaca o significado eterno do "Deus que se fez homem". Veja mais aqui: O BATISMO DE JESUS
Da esquerda para a direita: o rio Jordão perto do mar da Galiléia. A maior parte do ministério público de Jesus se passou nesta região. Jerusalém vista de cima. Jesus foi a Jerusalém pela primeira vez quando menino. Ele visitou a cidade, acompanhado por seus discípulos, por ocasião das grandes festas. Foi em Jerusalém que Ele morreu.
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Para que aproveis as coisas excelentes, para que sejais sinceros, e sem escândalo algum até ao dia de Cristo;
Cheios dos frutos de justiça, que são por Jesus Cristo, para glória e louvor de Deus.
Filipenses 1:9-11