JESUS numa sociedade pluralista
Os autores bíblicos viviam num ambiente social tão pluralista quanto o nosso em matéria de religião. Israel foi chamado para andar nos caminhos do Senhor sob o olhar atento de outras nações. A singularidade do etos social de Israel vinha da revelação única que Deus confiara a Israel.
Deus, como criador e soberano do mundo, estava agindo na história de todas as nações e culturas. Mas em nenhuma nação além de Israel Deus agiu por amor a todas as nações.
Sempre que os israelitas pensavam que Deus era apenas mais uma divindade tribal ou tentavam adorar a Deus à maneira dos ritos de fertilidade comuns entre os cananeus, eles estavam traindo a sua vocação no mundo.
Segundo os autores dos Evangelhos, a história de Israel alcança a sua verdadeira plenitude em Jesus de Nazaré. Ele incorpora os propósitos de Deus para as nações ao viver como o Filho que é fiel a Deus. Ele é aquele sobre quem Moisés havia escrito, aquele que fez com que Abraão ficasse alegre, ao ver o tempo da vinda dele, aquele que é Senhor até de Davi. Nele converge o conjunto de imagens do Antigo Testamento, tanto do "Servo de Deus" de Isaías, suportando a ira de Deus para curar as nações, quanto do "Filho do Homem" de Daniel, recebendo um reino eterno que abrange todos os povos.
Mas Jesus também traz a história de Deus a seu verdadeiro clímax. Desde o início, a igreja cristã, que também vivia num mundo religiosamente pluralista, considerou adequado falar de Jesus na linguagem usada para Deus nas escrituras hebraicas. Eles adoravam ou prestavam culto a Jesus. Algumas das primeiras "cristologias" eram expressas em hinos de adoração coletiva.
"A reivindicação não é tanto que Jesus é como Deus, mas que Deus é como Jesus."
Um fragmento de um destes hinos primitivos provavelmente encontra-se nas palavras seguintes, escritas cerca de 25 anos após a crucificação. É parte de uma carta que Paulo, líder cristão de origem judaica, escreveu para uma das igrejas que fundara na colônia romana de Filipos. Ele escreve sobre "Cristo Jesus" (Fp 2.6-11):
Que, sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus, mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens; E, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz.
Por isso, também Deus o exaltou soberanamente, e lhe deu um nome que é sobre todo o nome;
Para que ao nome de Jesus se dobre todo o joelho dos que estão nos céus, e na terra, e debaixo da terra, e toda a língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai. (Fp 2:6-11)
Nesta passagem, " o nome que está acima de todo nome" é uma alusão clara a Is 45.22-24 na Bíblia hebraica, uma passagem na qual Deus declara ser o único Salvador universal. Ele convoca todas as nações da terra a dobrarem os joelhos diante dele. Mas aqui, é ao nome de Jesus que, no final da história humana, todo joelho se dobrará. O mundo inteiro reconhecerá que Jesus é o Senhor verdadeiro. E esta reivindicação surpreendente é feita sobre um criminoso judeu que fora recentemente executado!
Igualmente literário em que isto aparece - uma exortação para imitar esse Cristo em sua mentalidade humilde e atitude de servo!
Aqui novamente, como no Israel antigo, o povo da aliança de Deus (neste caso, a igreja de judeus e gentios) proclama a singularidade de Deus/Cristo andando como Deus/Cristo andou.
Ruínas de uma antiga igreja em Gadara,(FOTO) uma das Dez Cidades (gregas) que, na época de Jesus, ficavam nas imediações da Galiléia, Jesus fez a afirmação de que ele é o único caminho que leva a Deus num mundo semelhante ao nosso, ou seja, um mundo em que diferentes religiões disputavam a preferência das pessoas.
Esta visão elevada de Jesus certamente veio da maneira como o próprio Jesus via sua relação com Deus e Israel. Tanto o ensino de Jesus quanto seu estilo de vida implicam uma profunda auto-compreensão. Para Jesus, o "reino de Deus" - a grande esperança de Israel quanto à presença salvadora de Deus - estava irrompendo no mundo, e tomando forma em e por meio de suas palavras e ações.
Na sua presença, homens e mulheres recebiam perdão incondicional de seu pecado. Pessoas que haviam fracassado moralmente e não tinham vez na sociedade recebiam uma nova identidade e eram inseridos em novos relacionamentos. Ao declarar tal perdão Jesus deixava de lado o Templo com seu sacerdócio divinamente instituído e seu sistema sacrificial. Como o Templo em Jerusalém representava a própria identidade de Israel como nação, a ação de Jesus era realmente radical.
Jesus apresentou-se também como aquele a quem todas as nações prestarão contas no fim da história. Na história extraordinária do julgamento final em Mt 25.31-46, a base do julgamento será a resposta das nações a ele - expressas na sua resposta àqueles com quem ele se identificou. A forma positiva como Jesus muitas vezes assumia direitos e prerrogativas de Deus escandalizou seus contemporâneos e provocou a indignação das autoridades religiosas.
No centro da fé e da pregação dos primeiros discípulos estava a afirmação de que Jesus havia sido ressuscitado por Deus: que durante um período de 40 dias após sua crucificação ele apareceu a eles num corpo físico e depois continuou a comunicar-se com eles, a "habitar" neles e capacitá-los por meio de uma nova atuação do Espírito.
Na crença judaica daquele tempo, "ressurreição" representava a derrota do mal, a vinda de uma nova ordem mundial. Esta linguagem foi aplicada a Jesus após a sua ressurreição porque deu significado a suas palavras e obras anteriores à crucificação. Por intermédio de Jesus, o Deus Criador tiraria sua criação da sujeição ao mal e à morte e a elevaria para compartilhar sua própria vida.
"É ao nome de Jesus que, no final da história humana, todo joelho se dobrará."
A esperança judaica de ressurreição agora se torna fé em Jesus que, em Jo 11.25, afirma ser "a ressurreição e a vida". Ao ressuscitar Jesus, Deus lhe deu seu próprio poder de levantar os mortos. Ele é o "Autor da vida" (At 3.15), "aquele que vive" (Ap 1.18; comparar com o uso desta expressão como título divino em Dt 5.26; Js 3.10; Sl 42.2, etc.), o "espírito vivificante" (1Co 15.45), aquele a quem o Pai concedeu "ter vida em si mesmo" para que também possa dar vida a outros (Jo 5.21-26).
Ao falarem de Jesus, Espírito e Deus ao mesmo tempo, os apóstolos não só fazem declarações extraordinárias sobre Jesus, mas também fazem declarações surpreendentes sobre Deus. A reivindicação não é tanto que Jesus é como Deus, mas que Deus é como Jesus. Jesus, e especialmente Jesus na sua crucificação, é de certa forma a plenitude da divindade numa personalidade humana. Com esta convicção os primeiros cristãos se negavam a considerar-se apenas membros de uma "religião" entre várias: eles eram testemunhas entre as nações do que Deus, em Jesus, fizera por toda a humanidade.
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Filipenses 1:9-11