Poco antes das 3 da tarde, Jesus pronunciou, com voz forte, estas palavras que Mateus e Marcos conservam na língua hebraica: Eli, Eli, lamá sabactani, isto é, Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste? (Mt 27.46). Esse grito de angústia, de indizível aflição, foi tomado de Salmos 22.1.
Como, porém, explicar que houvesse na alma de Cristo tal abismo de dor e que, no momento em que Ele se sacrificava heroicamente para cumprir a vontade do Pai, pudesse dizer que Deus o havia desamparado? Existe aqui um profundo mistério.
Não é possível ao ser humano conciliar essa horrível angústia com a bem-aventurança que reinava na alma de Jesus. Mas podemos entender pelo desamparo que Jesus padeceu, até que ponto Ele assumiu as fraquezas da natureza humana. Deus, de forma alguma, havia desamparado o Seu Filho. Ao mencionar o abandono, Jesus procurava apenas expressar melhor os sofrimentos físicos e morais que experimentava e o peso esmagador do pecado humano, dos quais se fizera fiador.
A queixa de Jesus é torturante, mas não é um protesto desesperado. Ao contrário, é uma queixa resignada, porque é o clamor do Filho submisso ao Pai. Cristo se sujeitara à vontade paterna, contentando-se em perguntar o porquê de tantos sofrimentos. Mas esse sentimento de angústia foi de curta duração, pois Jesus logo recobrou a serenidade habitual.
Alguns dos presentes - judeus, sem dúvida, porque os soldados da guarda não deviam entender o aramaico, muito menos conheciam o profeta Elias - disseram uns aos outros: Este chama por Elias (Mt 27.47). Imaginaram que Jesus clamava pela ajuda do famoso profeta ao qual os israelitas sempre atribuíram poder extraordinário, especialmente para socorrê-los em tempos de tribulação. Além disso, era opinião comum que Elias haveria de desempenhar um papel importante nos dias do Messias (Mt 17.10,11; Mc 9.10,11; Lc 1.17).
Logo em seguida, Jesus manifestou um dos tormentos mais atrozes dos crucificados: Tenho sede. João, o único evangelista que cita a frase, a introduz com uma expressão solene: Sabendo Jesus que já todas as coisas estavam terminadas, para que a Escritura se cumprisse, disse: Tenho sede (Jo 19.28,29). Esta expressão, pronunciada em meio a uma ardente febre, cumpria antigas profecias que apontavam a sede como parte dos sofrimentos do Messias: a língua se me pega ao paladar (Sl 22.15b); na minha sede me deram a beber vinagre (Sl 69.21).
Um dos presentes junto à cruz, movido de compaixão, tentou ajudá-lo. Pegando uma esponja que ali havia - talvez usada para banho dos soldados depois da crucificação -, molhou-a na mistura que já falamos. Depois, fixando-a em um galho de hissopo (uma planta medicinal), umedeceu com ela os lábios ressecados de Cristo. Mas os outros tentaram impedir, dizendo com cruel ironia: Deixa, vejamos se Elias vem livrá-lo (Mt 27.49).
E, quando Jesus tomou o vinagre, disse: Está consumado (Jo 19.30). Esta frase expressa perfeita obediência, pois resume toda a obra de nosso Senhor Jesus Cristo, predita nas profecias e figuras do Antigo Testamento e realizada pelo Messias ponto a ponto, desde que entrou no mundo, por meio da encarnação, desde que o Verbo se fez carne, até o último momento de Sua vida terrena. Ao mesmo tempo, é uma expressão de santa alegria e de glorioso triunfo, porque proclama muitas vitórias. Agora Cristo já podia morrer em paz e ir descansar no seio do Pai. Aleluia!!!
A MORTE DE JESUS
Pouco depois, Jesus pronunciou a Sua última palavra na cruz, também uma citação de Salmos (31.5): Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito (Lc 23.46). O Salvador pronunciou essas palavras em voz alta para indicar que ainda lhe restavam forças. Depois, inclinou a cabeça e, na plenitude de Sua liberdade, como cabia ao Messias, ao Filho de Deus, exalou o Seu último suspiro (Mt 27.50; Mc 15.37; Lc 23.46; Jo 19.30).
Eram 3 horas da tarde, hora em que se oferecia o sacrifício vespertino no Templo. Esse sacrifício consistia na imolação de um cordeiro sem mancha. Mas, apesar de sua solenidade, não há como compará-lo ao sacrifício do verdadeiro Cordeiro pascal imolado no altar da cruz (1Co 5.7), porque o sacerdote que o oferecia era o Próprio Deus (Jo 3.16), e o Sumo Sacerdote e o Cordeiro perfeitos que se entregou sem resistência alguma para ser imolado (Ef 5.2).
O sacrifício de Jesus foi oferecido uma única vez e substituiu todos os outros, tal como a sombra desaparece diante da luz e a figura diante da realidade. Não é possível, pois, conceber sacrifício mais perfeito, que reúna melhor tudo quanto possa agradar a Deus e que traga do céu à terra todas as bênçãos necessárias. Assim, a cruz, um instrumento cruel e vergonhoso, passou a representar o meio para a glória do próprio Cristo e tornou-se o símbolo mais significativo para os cristãos piedosos!
Jesus é traspassado por uma lança
Aproximava-se já o Sábado, que começava ao pôr-do-sol. Aquele era um Sábado particularmente solene, porque caía dentro da oitava Páscoa. Por esse motivo, os membros do Sinédrio, que tanta pressa tivera para obter a crucificação de Jesus, não agiram diferente para retirar da cruz o corpo do Mestre e dos dois ladrões.
Era costume dos romanos deixar os crucificados longas horas pendurados na cruz, às vezes até o corpo entrar em decomposição ou até ser devorado pelas feras e pelas aves de rapina.Raríssimas vezes, o corpo era entregue à família. Mas a lei mosaica proibia expressamente que os cadáveres dos condenados passassem a noite no madeiro (Dt 21.22,23).
Violar esse mandamento significava profanar a Terra Santa e atrair a maldição divina. Por isso, antes que Jesus expirasse, os príncipes dos sacerdotes e os membros do Sinédrio pediram a Pilatos que apressasse a agonia dos condenados na cruz. O governador prontamente enviou alguns soldados, os quais quebraram primeiro as pernas dos ladrões crucificados à direita e à esquerda de Jesus [para acelerar a morte deles]. Mas, ao aproximarem-se do Salvador, viram que este já estava morto e não lhe desferiram os terríveis golpes.
Um deles, porém, para maior segurança, traspassou o peito de Jesus com a sua lança. Do ferimento aberto, suficientemente largo para que o apóstolo Tomé pudesse introduzir nele a mão inteira (Jo 20.27), saiu sangue e água. Segundo a medicina, isso aconteceu quando o pericárdio, bolsa extremamente fibrosa que reveste o coração, foi atingido pela lança.
O apóstolo João revela nesse fato o cumprimento de duas profecias. Por ordem do próprio Deus, os judeus não podiam quebrar os ossos do cordeiro pascal (Êx 12.46; Nm 9.12), que era uma figura do Redentor. Os soldados, ao deixarem de quebrar as pernas de Jesus, estavam cumprindo a Escritura, que diz: Nenhum dos seus ossos será quebrado (Jo 19.36).
O golpe com a lança também cumpriu outra profecia: E olharão para mim, a quem traspassaram (Zc 12.10). Essa é a comovente descrição do arrependimento que sentirão os judeus quando se converterem e levarem em conta o crime que cometeram crucificando o seu Messias.
Entre a morte e a ressurreição ⇒ Mais detalhes da ressurreição
O que aconteceu com a alma do Senhor depois que Ele deixou o Seu corpo sem vida pendurado na cruz? Os evangelistas não dizem, mas o próprio Jesus havia anunciado ao ladrão, pouco antes de expirar, que depois de Sua morte ia ao Paraíso, ou seja, ao lugar onde ficavam os justos após a morte (Lc 23.43). Foi aí, portanto, que ficou a alma de Jesus durante o período que transcorreu entre o Seu último suspiro e a ressurreição.
Esse mesmo ensino é ministrado pelo apóstolo Pedro, quando diz que Cristo padeceu uma vez pelos pecados, o justo pelos injustos, para levar-nos a Deus; mortificado, na verdade, na carne, mas vivificado pelo Espírito, no qual também foi e pregou aos espíritos em prisão (1Pe 3.18,19).
Antes de colocar 1 Pedro em seus devidos contextos, os leitores podem sair com qualquer interpretação que escolherem - incluindo uma que considere o esvaziamento do Sheol e a transferência dos crentes para o céu. No entanto, o anúncio de Jesus não acompanha uma viagem do Hades ao Céu; em vez disso, 1 Pedro 3:18 relata o momento em que Jesus profere um julgamento decisivo sobre os seres divinos inferiores que se rebelaram contra Deus.
ASCENSÃO DE CRISTO |
Jesus retorna ao céu
Depois de ter dado instruções, ocorreu a ascensão gloriosa, que põe fim à vida terrena de nosso senhor Jesus Cristo. Marcos e Lucas fizeram um compêndio destes fatos (Mc 16.19,20; Lc 24.50-53; At 1.9-11). Da mesma forma sobrenatural como entrou no mundo, o Filho de Deus subiu ao céu.
Tendo consigo os apóstolos, alguns discípulos e as santas mulheres, entre elas Maria, a sua mãe - segundo se crê, no dia da ascensão eles estavam no Cenáculo reunidos com os fiéis -, Jesus os levou ao monte das Oliveiras, em um lugar que atualmente ocupa a aldeia muçulmana Et-Tur, situada a dois quilômetro a noroeste de Betânia. desta célebre colina, alguns dias antes da sua morte, havia partido um cortejo que conduzira alegremente Jesus em sua entrada triunfal a Jerusalém. Este mesmo lugar serviria de último pouso dos pés do Salvador, que empreenderia seu regresso em direção ao céu como Verbo eterno de Deus.
Enquanto Jesus desaparecia entre as nuvens, os discípulos, prostrados em terra em atitude de adoração, continuavam olhando em direção ao céu, esperando voltar a vê-Lo. Porém, dois anjos em forma humana, vestidos de branco, colocaram-se ao lado deles, como no dia da ressurreição de Cristo, e falaram: Varões galileus, por que estais olhando para o céu? Esse Jesus, que dentre vós foi recebido em cima no céu, há de vir assim como para o céu o vistes ir (At 1.11).
Os apóstolos regressaram, pois, a Jerusalém com um grande vazio no coração, pois sabiam que já não gozariam a carinhosa presença física de seu amado Mestre [lágrimas]. Porém, também estavam cheios de alegria e esperança , porque o Salvador não havia ficado no túmulo, mas ressuscitara e voltara cheio de glória para o seio do Pai, para que sua natureza humana e santa recebesse um lugar honroso, que tanto fizera por merecer.
Assim acabou gloriosamente a vida do Salvador entre os homens. Ele está assentado à direita de Deus, Seu Pai, governando, protegendo e abençoando a Sua Igreja, a qual os seus olhos não perdem de vista nem o Seu coração pode jamais esquecer.
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Para que aproveis as coisas excelentes, para que sejais sinceros, e sem escândalo algum até ao dia de Cristo;
Cheios dos frutos de justiça, que são por Jesus Cristo, para glória e louvor de Deus.
Filipenses 1:9-11